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quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Jardim Japonês






Os nipônicos são reconhecidos e admirados no munto todo pela tenacidade, pela serenidade e pelo apreço à organização. Atributos pertencentes ao povo, mas que também se aplicam ao estilo das áreas verdes encontradas no país. "O paisagismo japonês é uma das mais elevadas formas de arte. Os elementos filosóficos, religiosos e simbólicos são características marcantes, combinando pedra, água e planta de maneira simples e, ao mesmo tempo, perfeita", relata Ivani Kubo, paisagista, de São Paulo, SP.

De acordo com Sarkis Kaloustian, arquiteto e autor do livro Jardim Japonês - A Magia dos Jardins de Kyoto, da capital paulista, as áreas verdes no Japão surgiram com a intenção de imitar o cosmos do budismo. "A primeira data do ano 612. Elas passaram por uma evolução contínua e hoje os paisagistas buscam hibridizar o estilo utilizando materiais contemporâneos", informa ele, que passou quatro anos em Quioto com o objetivo de realizar uma profunda pesquisa sobre o assunto. 

Na verdade, existem cinco tipos de jardins japoneses. "Há o de passeio com lago, que é monumental e conta com árvores de grande porte, e o de contemplação, menor e com um pequeno lago construído para ser observado de um ponto fixo. O de paisagem seca é elaborado com pedriscos e rochas e conhecido como zen. Enquanto o da cerimônia do chá precede o caminho até o casebre onde é realizado o rito que celebra a união entre as pessoas, já o mínimo fica na casa e geralmente é bem pequeno", diz Kaloustian. Entretanto, apesar da distinção entre eles, todo jardim japonês é marcado pelo aspecto simbólico (com paisagens que imitam cenas da natureza) e pela assimetria. 

A arquiteta paisagista Pedrinha Parisi, de São Paulo, SP, afirma que o estilo do jardim japonês nasceu como um símbolo sagrado, sendo um local de contemplação onde o homem se encontra com Deus. Por isso, todos os elementos naturais eram reproduzidos fielmente em ambientes de grandes proporções. "Mas os elementos que o compõem foram miniaturizados e as mensagens que convidam à reflexão e estimulam a espiritualidade podem ser executadas em pequenos espaços."





OS PROTAGONISTAS

Diversos elementos compõem um jardim japonês, mas as rochas são os mais importantes. "São fundamentais e um marco. Conforme o posicionamento, podem remeter à família, ao sistema solar, aos deuses etc. Sempre são empregadas em números ímpares, uma vez que na cultura oriental os pares são fáceis de dividir e o objetivo do jardim é o contrário, unir", frisa Ivani.

A disposição triangular de pedras e vegetação do jardim japonês revela a trindade entre o mestre, a terra e o céu. E as rochas representam um componente imutável e formam um belo jogo de contrastes com as plantas, que sofrem mudanças.

"Depois das rochas e da vegetação, os elementos mais representativos são, em ordem de importância, lagos, pontes, bacias de pedra, lanternas, leito seco (pedrisco imitando rios), quedas d'água e pisos de pedra em formato assimétrico", acrescenta o arquiteto e escritor. Entretanto, este estilo pode contar ainda com pequenos riachos, portões cobertos por plantas, que dão as boas-vindas aos visitantes, e peças decorativas, como estátuas de divindades budistas, esculturas de pedra abstratas e pagodes.

Tudo o que compõe um jardim japonês esbanja simbolismo. "Nas representações da família, a pedra grande ou o pinus (Pinus spp) remete ao pai, a pedra menor ou azaleia (Rhododendron simsii) topiada à mãe e os bambus indicam os filhos. As lanternas chamadas de tooro iluminam os caminhos de Deus", exemplifica Pedrinha.



VEGETAÇÃO 

"A arte do paisagismo japonês consiste em concentrar a atenção somente sobre o essencial, seja nas formas precisas ou na sutileza das matizes. Assim, todas as plantas são extremamente valorizadas, sendo que as perenes são comumente usadas criando um quadro estável em todas as estações do ano", afirma Alex Hanazaki, arquiteto paisagista, da capital paulista.

Ele explica que árvores e arbustos representam o silêncio e a eternidade. Por exemplo, a cerejeira (Prunus serrulata) e o ácer (Acer palmatum), que, em japonês, respectivamente, chamados de sakuramomiji, são fundamentais na composição paisagística. "A cerejeira tem um significado especial, pois sua flor é conhecida como a flor da felicidade. A floração é comemorada no Hanami, durante os meses de março e abril, indicando o momento de sair da introspecção do Inverno e se abrir para o mundo."

Kaloustian aponta ainda como espécies típicas pinus-vermelho (Pinus densiflora), pinus-preto (Pinus thunbergii), criptoméria (Cryptomeria japonica), camélia (Camellia japonica), junípero (Juniperus chinensis torulosa) e musgo (Selaginella spp). "O bambu (Poaceae) não aparece nas áreas verdes tradicionais, somente em jardins mínimos. Ele representa tenacidade, porque enverga com os ventos, mas não quebra", acrescenta.

Ivani comenta que o modelo nipônico de jardim japonês utiliza muito verde, mas poucas floríferas, porque, na visão dos orientais, elas se transformam rapidamente e são efêmeras. "As cores, formas e texturas são secundárias, havendo mais ênfase às simbologias e representatividades dos elementos. A camélia, por exemplo, é usada antecedendo o espaço principal do jardim, pois suas pétalas caem, fazendo menção às cabeças decepadas dos samurais (antigos soldados da aristocracia japonesa)."

No Brasil, pode-se adotar espécies que se adaptam às condições climáticas encontradas, mas, ao mesmo tempo, manter o simbolismo. Dessa forma, executa-se um paisagismo que necessita apenas de podas esporádicas. Pedrinha indica a ardísia (Ardisia crenulata) que significa riqueza, a arália (Fatsia japonica) para defesa contra os males e o buxinho (Buxus sempervirens) que representa os espíritos guardiões.


ORGANIZAÇÃO 

"A intenção do jardim japonês é ser visualizado mais pelo pensamento do que pelos olhos. Como tem uma atmosfera de meditação, o silêncio é fundamental, levando tanto a interpretá-lo quanto a fazer um mergulho interno", ressalta o arquiteto e escritor.

Por isso, sua organização é muito peculiar. São seguidos critérios para localizar os elementos: os mais baixos ficam no lado onde nasce o sol para não projetarem sombra nas plantas. As podas ovaladas de azaleias e buxinhos acompanham as copas arrendondadas das árvores. E os pedriscos brancos com desenhos ondulados substituem o elemento água, quando este não se encontra no local.

Há o uso da água por ser importante na geografia do país e significar o paraíso budista. "Trata-se de uma imitação da natureza. Além do Japão ser uma ilha, pode-se observar a água descendo límpida e pura das montanhas até chegar às planícies. O líquido também significa asseio e limpeza", detalha Kaloustian.

Ela deve ter movimento natural e ser cristalina. "Na entrada da área verde, é comum ter uma cuba (tsukubai) para lavar as mãos, significando a 'limpeza da alma' para refletir e meditar"', adiciona Ivani. 


Fonte: Editora Casa Dois